Assentados da região da Borborema (PB) trocam experiências durante fórum em Campina Grande
Representantes de 32 assentamentos da região da Borborema, na Paraíba, estão reunidos esta semana, no Centro Diocesano, em Campina Grande, para discutir e encaminhar propostas para as áreas de reforma agrária e compartilhar experiências de sucesso. Durante os três dias do II Fórum dos Assentados e Assentadas da Borborema, iniciado na terça-feira (30), haverá dinâmicas e mesas-redondas, além de espaços para troca de conhecimentos sobre técnicas de plantio e fontes alternativas de renda. A primeira edição do evento foi realizada em maio, em Lagoa Seca, a 130 quilômetros da capital, João Pessoa.
Os assentamentos participantes são atendidos pela Cooperativa de Trabalho Múltiplo de Apoio às Organizações de Autopromoção (Coonap) - entidade que presta assistência técnica por meio de contrato com o Incra na Paraíba (Incra/PB) e é responsável pela realização do Fórum. Cerca de 80 pessoas participam do evento, entre assentados, técnicos, servidores do Incra e representantes de órgãos públicos como a Superintendência de Administração do Meio Ambiente (Sudema), a Empresa Estadual de Pesquisa Agropecuária (Emepa) e as secretarias estadual e municipal de Agricultura, além de movimentos sociais do campo.
A coordenadora da Coonap na Borborema, a assistente social Jaqueline Araújo, ressalta o caráter educativo do Fórum. "Além de oferecer informações sobre educação ambiental, educação no campo, assistência técnica e outras políticas públicas, os fóruns funcionam como espaços de discussão entre assentados e instituições sobre ações que podem melhorar a vida nos assentamentos e de confraternização entre os trabalhadores rurais assentados na mesma região, que aproveitam a oportunidade para compartilhar experiências", afirma.
As atividades do II Fórum tiveram início a partir de um almoço feito com alimentos produzidos nos assentamentos participantes e com a distribuição de kits contendo material informativo, além de uma caneca plástica para evitar o uso de copos descartáveis - estratégia de educação ambiental seguida pela Coonap. Durante o primeiro dia, os assentados participaram de mesas-redondas sobre infraestrutura hídrica nos assentamentos e sobre educação ambiental e reforma agrária. À noite, foi exibido o filme "Tempos Modernos" (1936), do cineasta britânico Charles Chaplin.
Iniciado com um resgate da história do assentamento Redenção, em Pilões, feito por jovens em forma de peça teatral, o segundo dia do evento foi dedicado a discussões sobre educação no campo e o programa de assistência técnica prestada nos assentamentos. À noite, a programação inclui uma peça teatral que abords a luta das mulheres no campo, apresentada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). No terceiro e último dia do evento os assentados irão assistir uma apresentação sobre o Programa Empreender Paraíba - política pública de microcrédito do governo estadual.
Troca de experiências
Morador do assentamento Vitória, em Campina Grande, o agricultor Severino Miguel Cordeiro, 57 anos, relatou sua experiência com a horticultura orgânica durante a mesa-redonda Educação Ambiental e Reforma Agrária. Assentado há cerca de 11 anos, até o último mês de abril Cordeiro se dedicava exclusivamente ao plantio de feijão e milho, mas decidiu apostar em hortaliças após orientação da equipe de assistência técnica da Coonap.
Em pouco mais de meio hectare, colhe coentro, cebola, alface, couve, pimentão, tomate, beterraba, cenoura e abobrinha. A variedade colore os pratos do almoço da família e é vendida em outras comunidades rurais do município de Campina Grande. "Já estou tirando um salário mínimo por mês, sem ter deixado de plantar o milho e o feijão, que também não levam agrotóxicos", revelou o assentado, acrescentando que não esperava um retorno tão rápido.
Usando defensivos naturais, produzidos artesanalmente a partir do alho, do nim (planta) ou de sabão, o assentado conquistou grande clientela nas comunidades vizinhas e sua experiência está servindo de exemplo de sucesso para as outras 39 famílias do assentamento Vitória. "Em todo canto que eu chego as pessoas perguntam logo se a horta é orgânica. Tem até gente que diz que vai olhar a horta e eu respondo que pode ir que não vai encontrar nenhum veneno", contou.
Para manter a qualidade e o caráter orgânico dos alimentos que produz, o assentado prefere perder o trabalho de meses a usar agrotóxicos. "Já perdi 600 pés de tomate porque deu uma praga e eu não quis usar veneno. Assim tenho certeza de que quem comer do meu produto não vai adoecer. Temos que aprender que não é só com veneno que a gente pode produzir", disse.
Cordeiro pretende aumentar a área ocupada pela horta para 1,5 hectare e, com o aumento da produção, passar a fornecer alimentos ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), e para uma feira agroecológica coordenada pelo Programa Fome Zero que deve começar a funcionar em Campina Grande no mês de outubro.
Saúde dentro e fora de casa
Outro assentado que relatou aos participantes do fórum os resultados obtidos com o cultivo orgânico foi José Alves de Souza, 60 anos, presidente da associação do assentamento Novo Campo, em Barra de São Miguel. "Agora, até a minha casa está mais fria. Viver em um ambiente sadio é outra coisa", afirmou Souza, ao contar que há cerca de dois anos iniciou, atrás da casa onde mora com a mulher e um filho, uma horta orgânica, desenvolvida por meio do projeto de Produção Agroecológica Integrada e Sustentável (Pais), do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae).
Ele recebeu treinamento para conhecer a nova técnica de cultivo e um kit com caixa d'água para cinco mil litros, sistema de irrigação, variedades de sementes de hortaliças, verduras e frutas, além de carro de mão, tela, madeira, pregos, dez galinhas e um galo. Souza explicou que a horta é regada com a água da caixa d'água e que as folhas podadas da plantação vão para as galinhas.
Com o sistema de produção no formato de círculos, o agricultor produz em um espaço pequeno uma grande variedade de alimentos: beterraba, cenoura, coentro, alface, pimentão, cebolinha, cebola, alho, couve e repolho, goiaba, graviola, laranja, limão, acerola, mamão, maracujá. Os itens são vendidos na própria comunidade e, há quase um ano, o assentado também fornece alimentos para o Pnae, atendendo uma escola que funciona no assentamento e outra na vizinha Comunidade Bandeira. São 140 ovos por semana, além de cebolinha, cebola, beterraba, cenoura e coentro.
Feira agroecólogica
Parte da produção de cinco assentamentos próximos a Campina Grande será comercializada na feira agroecológica coordenada pelo Programa Fome Zero, que deve começar a funcionar em outubro, todas as quartas-feiras, a partir das 5h, no Parque da Criança. Cada assentamento possuirá quatro barracas que, somadas, irão abrigar os alimentos produzidos por 20 famílias. Além de queijo, ovos, feijão, milho, macaxeira, hortaliças e frutas, os assentados, que receberão capacitação em comercialização, também devem expor os trabalhos de artesanato confeccionados principalmente pelos grupos de mulheres dos assentamentos.
"A feira vai eliminar os atravessadores e mostrar aos assentados que eles são capazes e, principalmente, mostrar à sociedade que os assentados produzem a maior parte do que vai para a mesa do homem da cidade", afirmou, durante o Fórum, o engenheiro florestal Vladimir Scheneider, da Coonap. A proposta é, segundo Scheneider, aumentar a produção dos assentamentos da região e comercializá-la não apenas na feira agroecológica, mas também fornecer alimentos ao Pnae e ao Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) - uma das ações do Fome Zero.
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